No regresso à normalidade luandenses lamentam "dias de guerra"

  • 31/07/2025

As consequências dos tumultos, violência e pilhagens registados no início desta semana, em Luanda, na sequência da paralisação dos taxistas, ainda continuam vivas na memória dos luandenses, que os descrevem como "dias de guerra".

 

A tensão dos últimos dias em Luanda contrastou hoje com o regresso à normalidade, com a capital angolana a registar, desde as primeiras horas do dia, a circulação fluida de pessoas e viaturas, onde os conhecidos "azuis e brancos", voltaram a colorir as principais vias da capital.

Paragens apinhadas de pessoas, postos de combustível, empresas, comércio e instituições em funcionamento assinalavam o retorno ao trabalho dos cidadãos, sem que os vestígios de atos de vandalismo e a presença de polícia em zonas estratégicas passem despercebidos.

Também não passou despercebida a barreira de contentores que atualmente cerca a sede do partido do poder desde a independência em Angola, o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), que mantém vigilância policial juntos dos seus comités.

Na vila do município de Cacuaco, norte de Luanda, a intensa presença de pessoas foi destacada por algumas "zungueiras" (como são conhecidas as vendedoras ambulantes) que condenaram os "dias de guerra" vividos com a greve dos taxistas.

"O dia de hoje está mais calmo e tranquilo (...), esses últimos dias foram de guerra e nem conseguimos sair", disse à Lusa a "zungueira" Lucinda Fernando, ao lado da sua bancada móvel onde estavam expostas bijuterias e outras quinquilharias.

Para esta vendedora ambulante, a paralisação dos taxistas que serviu para contestar a subida do combustível e da tarifa dos transportes, foi aproveitada também por marginais para saquear e destruir bens públicos e privados.

"Acredito que [nesta paralisação] não se ganhou nada, porque o país ficou parado, muita coisa se perdeu, nós perdemos e acredito que na caixa do Estado não entrou nada", referiu Lucinda, de 33 anos, que disse ter se "ajeitado" com o pouco que tinha na despensa para alimentar os filhos.

Com os tumultos registados em Luanda, o "país perdeu muita coisa, as lojas e armazéns partidos, e não queremos que isso aconteça mais", desabafou Emília António Paulino, também vendedora ambulante, que tenta esquecer as cenas de destruição a que assistiu.

Enalteceu o regresso ao trabalho, recordou que viveu momentos dramáticos no segundo dia da greve dos taxistas, onde perdeu alguns bens que vendia e regressou a casa a pé por falta de transportes.

"O dia de hoje está muito bem, na terça-feira nós sofremos muito, não queremos mais ter guerra no país, queremos que o país esteja bem (...). Perdemos muitas coisas, destruíram muita coisa e queremos que o nosso Presidente [da República] faça alguma coisa para o nosso país", exortou.

À Lusa, Carlos Joaquim, 21 anos - que diz ter sido vítima de violência durante o saque ao armazém em que trabalha no município do Hoji-Ya-Henda -, afirmou acreditar que as ações de vandalismo registados na capital angolana vão agravar ainda mais o desemprego no país.

Com uma muleta a auxiliar a sua mobilidade, devido aos ferimentos no pé esquerdo, que diz terem sido causados por pedras arremessados para o interior do estabelecimento em que trabalha, Carlos lamentou as cenas de pilhagens que comprometem a economia do país.

"O país perdeu mais e automaticamente a taxa de desemprego vai aumentar, porque diretamente os mais afetados foram os comerciantes e são muitas lojas que foram danificadas, a taxa de fome e desemprego vai aumentar e só temos a perder", deplorou.

Taxistas e "lotadores" (como são conhecidos os jovens angariadores de passageiros para os táxis) também destacaram o retorno à normalidade na sua atividade, criticando, contudo, os "tristes episódios" de vandalismo, que resultaram em vários mortos e feridos.

"Foi de facto triste mesmo aquilo que aconteceu, porque nós os taxistas paramos para poder cumprir o nosso dever, mas infelizmente apareceram grupos infiltrados que não gostam do bem", afirmou Osvaldo Manuel, taxista há 30 anos, a bordo do seu "azul e branco" na conhecida paragem da Kianda, bairro do Kikolo.

Grande parte dos armazéns deste local estiveram hoje abertos, com grande concentração de vendedoras ambulantes e moto taxistas, tendo sido também destacada uma equipa da Polícia de Intervenção Rápida, que foi chamada para travar uma tentativa de distúrbios, como disse o "lotador" Guilherme Major.

Guilherme e o seu colega Paulino Pedro José renderam "graças a Deus" pelo início do dia sem quaisquer constrangimentos, considerando mesmo que os dias de tumultos "foram complicados" e que o país perdeu muito com os atos de vandalismo.

Entre segunda e quarta-feira, Luanda foi palco de tumultos e pilhagens durante a paralisação convocada por taxistas, que resultaram em mais de 22 mortos e 197 feridos e mais de 1.200 detidos.

Leia Também: Luanda. Mãe morta a tiro nos tumultos deixa seis órfãos e bairro em luto

FONTE: https://www.noticiasaominuto.com/mundo/2831127/no-regresso-a-normalidade-luandenses-lamentam-dias-de-guerra#utm_source=rss-mundo&utm_medium=rss&utm_campaign=rssfeed


#Compartilhe

Aplicativos


Locutor no Ar

Anunciantes